Estamos Vivendo Num Tempo Especial?

Thomas W. Cabeen


Um ensinamento antigo e muito proeminente da Torre de Vigia é a crença de que em 1914 um período especial de tempo, que Jesus chamou de "Tempos dos Gentios", terminou, os "últimos dias" começaram, e Cristo começou a governar sobre toda a terra pela primeira vez desde sua ressurreição e ascensão ao céu. Imediatamente antes dessa época, dizem, Jesus, em antecipação ao seu reinado iminente, começou a inspecionar as organizações religiosas do mundo para ver qual delas seria o seu representante oficial quando ele começasse a governar em 1914. Ele examinou os ensinamentos de todas as denominações na terra que afirmam ser cristãs e decidiu que a mais "fiel" (ou seja, aquela com a interpretação mais correta da Bíblia) era o pequeno grupo de seguidores de Charles Russell, mais tarde conhecidos como Testemunhas de Jeová. Como resultado (de acordo com as publicações da Torre de Vigia), pouco depois de 1914, Jesus entregou todos os interesses do seu reino nas mãos deles, e eles tornaram-se o seu único canal aprovado de comunicação entre Deus e a humanidade.

Se estiverem corretos, algo muito significativo mudou em 1914. As coisas teriam de ser diferentes desde 1914 do que foram durante o resto da era cristã. Se isto se provasse verdade, acrescentaria alguma credibilidade à sua afirmação de que a Sociedade Torre de Vigia, com as suas origens no século 19, é a única denominação cristã que Deus aprova. Por outro lado, se o peso da evidência bíblica e histórica não apoiar esta conclusão, as afirmações da Torre de Vigia são profundamente suspeitas. O objectivo deste artigo é ajudar a esclarecer as implicações do ponto de vista da Torre de Vigia.

Desde a sua origem, os ensinamentos fundamentais da Sociedade Torre de Vigia têm sido baseados e intimamente ligados à ideia de que estudantes sérios da Bíblia podem determinar com razoável precisão o tempo do regresso de Cristo em glória, quer através de cálculos cronológicos, observação de eventos mundiais únicos à luz da profecia bíblica, ou por alguns outros sinais que serviriam como preditores confiáveis do iminente retorno ou advento de Cristo. Os cristãos que acreditam que isto é possível têm sido chamados de "adventistas".

Primeiro, examinemos a cronologia que, de acordo com as afirmações da Torre de Vigia, estabelece que 1914 marcou o fim de um período especial e o início de outro.


A Cronologia da Torre de Vigia é Correta?

Charles T. Russell tomou de empréstimo grande parte de sua cronologia e metodologia dos Segundo Adventistas, que se desenvolveram após a tentativa fracassada de William Miller de prever o retorno de Cristo em 1843. Os cálculos são baseados em grande parte nas interpretações de passagens em Daniel 4 e Lucas 21. Em resumo, as Testemunhas ensinam que os "Tempos dos Gentios" são um período especial de 2.520 anos durante o qual o reino de Deus (especificamente a dinastia de Davi) não teve rei. Eles acreditam que este período começou quando Jerusalém foi destruída nos tempos pré-cristãos pelos exércitos babilônicos e que terminou em 1914. Considerando a importância das conclusões que supostamente sustenta, a cronologia baseia-se numa série bastante tênue de suposições:

  • Primeiro, que o sonho que Nabucodonosor teve sobre se tornar uma besta por "sete tempos" (registrado em Daniel 4) não se refere principalmente a ele (como afirmado diretamente no texto), mas sim que ele, um rei pagão, nem mesmo um adorador. do Deus de Israel, na verdade representa o reino de Deus.

  • Segundo, que o reino ou governo de Deus sobre a humanidade de alguma forma "terminou" quando Zedequias, descendente direto de Davi, foi removido do trono de Jerusalém quando este foi destruído pela Babilônia, e que o reino "começaria" novamente cerca de vinte e cinco séculos depois, quando Jesus, também descendente de Davi, começou a governar em 1914. Os judeus esperavam que um descendente de Davi governasse como rei para sempre, mas o conceito do reino ou soberania de Deus "terminando" naquele momento e "começando" em alguma data posterior nunca é sugerido nos escritos sagrados judaicos. Na verdade, esta ideia contradiz diretamente Daniel 4:17, que está ligado à experiência bestial de Nabucodonosor!

  • Terceiro, com base na primeira suposição, cada "tempo" deve representar um ano "profético" especial de 360 dias, embora nenhum ano terrestre real, solar ou lunar, tenha 360 dias.1 Sete destes anos proféticos de 360 dias totalizariam 2.520 dias "proféticos".2 Cada um destes dias "proféticos", por sua vez, deve representar um ano solar de aproximadamente 365¼ dias. Absolutamente nada nas Escrituras, na tradição judaica ou nos escritos dos primeiros cristãos sugere que possamos fazer esta complicada série de suposições e cálculos.

  • Quarto, que este período de 2.520 anos solares é idêntico ao que Jesus se referiu quando usou a expressão traduzida como "os tempos determinados das nações" ou "os tempos dos gentios" em Lucas 21:24 ("Jerusalém será pisada pelas nações até se cumprirem os tempos determinados das nações"), embora Jesus estivesse discutindo especificamente a futura destruição de Jerusalém pelos romanos em 70 d.C., e não a sua destruição passada pelos babilônios, e apesar do fato de que não há uma única palavra nas Escrituras, na tradição judaica ou nos escritos cristãos que indica que os "tempos dos gentios" se referem a qualquer período de tempo durante o qual o reino eterno de Deus estaria inativo.

  • Quinto, que Jerusalém foi destruída pelos exércitos de Nabucodonosor em 607 a.C.. A data da destruição de Jerusalém é uma das fixadas com mais precisão na história antiga. Ainda mais significativo, as fontes históricas que estabelecem a data da queda de Babilónia em 539 a.C. (data que a Sociedade Torre de Vigia aceita e, de facto, que utiliza como ponto de partida para os seus cálculos de 1914) são exactamente as mesmas fontes que estabelecem 587/6 a.C. como a data da destruição de Jerusalém! Várias linhas de evidência independentes (históricas, astronômicas, arqueológicas, etc.) apontam para a data de 587/6 a.C., e não 607 a.C., como a data da destruição de Jerusalém. Não há nenhuma evidência histórica credível que apoie a data de 607 a.C.. (Veja The Gentile Times Reconsidered (Os Tempos dos Gentios Reconsiderados), de Carl Olof Jonsson, Commentary Press, 1998, para uma discussão detalhada deste tópico.)

  • Sexto, que todas as muitas passagens nas Escrituras Gregas que afirmam claramente que Jesus começou a governar no primeiro século, como Mateus 28:18: "Foi-me dada toda a autoridade no céu e na terra", não significam realmente o que dizem. Abaixo está uma discussão mais extensa sobre as implicações dessa suposição.

Cada uma das seis suposições listadas acima estão inter-relacionadas. A veracidade de todas elas juntas é absolutamente crítica para o ensino da Torre de Vigia de que em 1914 o mundo entrou num período de tempo especial conhecido como "o tempo do fim" e que Jesus escolheu a Sociedade Torre de Vigia como o canal oficial de comunicação de Deus com o seu povo fiel. na terra. Se qualquer uma delas estiver errada, a conclusão final é completamente inválida e a afirmação da Torre de Vigia é comprovadamente falsa.

Vale a pena notar que Russell, usando a mesma metodologia, "provou" que ele próprio estava vivendo num período de tempo especial, que ele acreditava que terminaria em 1914 com o retorno de Cristo para julgar as nações. Ele também admitiu que se qualquer um dos pressupostos nos quais baseou as suas conclusões estivesse errado, isso invalidaria tanto a sua abordagem como as suas conclusões. Isso, de fato, aconteceu. Com o tempo, quase todas as suas suposições foram rejeitadas, e a data final de Russell para o tempo do fim (1914) tornou-se a data inicial para o mesmo período nos ensinamentos posteriores (e atuais) da Torre de Vigia.


Quando Jesus Começou a Reinar?

Se a cronologia da Torre de Vigia é inválida e Jesus não começou o seu reinado em 1914, estará ele a reinar agora? Se sim, quando esse reinado começou? As publicações da Torre de Vigia interpretam Hebreus 1:13 ("Sente-se à minha direita, até que eu ponha os seus inimigos debaixo dos seus pés") da seguinte forma:

"Em 33 EC, [Jesus] morreu, foi ressuscitado e ascendeu para o céu. [...] Naquela época, porém, Jesus não atuou como Rei e Juiz sobre as nações. Ficou sentado junto a Deus, aguardando o tempo de agir como Rei do Reino de Deus. Paulo escreveu sobre ele: "Com referência a qual dos anjos disse ele alguma vez: 'Senta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos como escabelo para os teus pés'?" -- Hebreus 1:13. As Testemunhas de Jeová têm publicado muita evidência de que o período de espera de Jesus expirou em 1914, quando ele se tornou governante do Reino de Deus nos céus invisíveis." (A Sentinela, 15 de outubro de 1995, pp. 20-21, parágrafos 14-16, ênfase adicionada)

Hebreus 10:12, 13 diz: "Mas ele ofereceu um só sacrifício pelos pecados para sempre e sentou-se à direita de Deus, daí em diante esperando até que os seus inimigos sejam postos debaixo dos seus pés." Se esta fosse a única referência ao Salmo 110 nas Escrituras Cristãs, e não houvesse mais nada que indicasse o contrário, este versículo poderia de fato ser interpretado como significando que a palavra "espera" nesta passagem se refere a um período de não-governo. É exatamente assim que a Sociedade Torre de Vigia interpreta:

"Mesmo após a ressurreição e a ascensão de Jesus ao céu, ele teve de esperar à mão direita de seu Pai até vir o tempo de ele governar a humanidade como Rei. (Hebreus 10:12, 13)" (A Sentinela, 15 de junho de 1994, p. 6)

Mas era assim que os apóstolos e os primeiros cristãos entendiam a expressão "Senta-te à minha direita"? Não! Entre os povos antigos, a imagem de um rei sentado no trono de seu Deus era uma forma comum de expressar que o rei governava com a aprovação e o apoio de seu Deus. Isto é consistente com a forma como os primeiros cristãos entendiam esta frase, como veremos.3

Este não é o único lugar onde esta expressão do Salmo 110 é citada nas Escrituras Gregas Cristãs. Na verdade, esta passagem das Escrituras Hebraicas é a mais citada nas Escrituras Cristãs. Assim, podemos examinar todas as suas ocorrências para estabelecer corretamente como foi usada e compreendida. A interpretação da Torre de Vigia de que "estar sentado" significa "esperar" é exigida pela sua crença baseada na cronologia de que Jesus não poderia começar o seu reinado até 1914, como discutido acima. Mas fica bastante claro em muitos outros lugares onde esta passagem é citada que os primeiros cristãos não entendiam que a passagem significava não-governo. Eles entendiam que "sentado à direita de Deus" significava que Jesus governava como rei. Talvez o exemplo mais claro disso seja a citação que Paulo faz do Salmo 110 em sua primeira carta aos Coríntios, ao discutir a ressurreição. Nesta passagem, Paulo na verdade substitui o termo "governar como rei" por "sentar-se à direita de Deus" bem na citação:

"A seguir, o fim, quando ele entregar o Reino ao seu Deus e Pai, depois de ter reduzido a nada todo governo, toda autoridade e poder. Pois ele tem de reinar [no original em inglês: rule as king (governar como rei)] até que Deus lhe tenha posto todos os inimigos debaixo dos pés. E o último inimigo a ser reduzido a nada é a morte. [...] No entanto, quando todas as coisas lhe tiverem sido sujeitas, então o próprio Filho também se sujeitará Àquele que lhe sujeitou todas as coisas, para que Deus seja todas as coisas para com todos." (1 Coríntios 15:24-28, TNM, ênfase acrescentada.)

Fica claro pelo uso da passagem que Paulo entendia "colocar todas as coisas debaixo dos pés de Cristo" como significando governo. Por que não deveria ser assim, visto que depois da sua ressurreição, Jesus declarou explicitamente que lhe fora dada "toda a autoridade no céu e na terra"? Quando Jesus nasceu, o anjo Gabriel disse que ele receberia o trono de Davi, seu antepassado, e que reinaria para sempre. Portanto, seria muito natural que os apóstolos entendessem que as suas palavras pós-ressurreição significavam que ele estava reinando como seu rei, mesmo que a forma como o seu governo seria expresso fosse diferente do que eles esperavam. A declaração do salmista de que ele deveria reinar no meio de seus inimigos é consistente com a imagem de um governante que se senta em seu trono, à direita de seu Deus, e continua seu governo até que todas as coisas estejam sujeitas ao seu poder. Uma grande ressurreição ocorre naquele momento; assim a morte se torna o último inimigo a ser submetido a ele. Depois, escreve Paulo, o Filho se sujeita a Deus, o Pai.

Muitas outras passagens mostram que os apóstolos e os primeiros discípulos viam Jesus governando como rei em seus dias, várias das quais se referem ao Salmo 110. Aqui estão apenas algumas (todas citadas da Tradução do Novo Mundo):

Mateus 28:18-20: Jesus se aproximou e lhes disse: "Foi-me dada toda a autoridade no céu e na terra. Portanto, vão e façam discípulos de pessoas de todas as nações, batizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do espírito santo, ensinando-as a obedecer a todas as coisas que lhes ordenei. E saibam que eu estou com vocês todos os dias, até o final do sistema de coisas."

Marcos 16:19: Daí, o Senhor Jesus, depois de lhes ter falado, foi elevado para o céu e se assentou à direita de Deus.

João 5:26, 27: Pois assim como o Pai tem vida em si mesmo, assim concedeu também ao Filho ter vida em si mesmo. E deu a ele autoridade para julgar, porque ele é o Filho do Homem.

João 17:1, 2: Jesus falou essas coisas e, levantando os olhos para o céu, disse: "Pai, chegou a hora. Glorifica o teu filho, para que o teu filho te glorifique, assim como lhe deste autoridade sobre todas as pessoas, para que ele dê vida eterna a todos aqueles que lhe deste.

Colossenses 2:9, 10: [...] é nele que toda a plenitude da qualidade divina mora corporalmente. E vocês adquiriram uma plenitude por meio dele, aquele que é o cabeça de todo governo e autoridade.

Atos 17:6, 7: [...] arrastaram Jasão e alguns irmãos até as autoridades da cidade, gritando: "Aqueles homens que têm causado alvoroço na terra habitada também estão aqui, e Jasão os recebeu como hóspedes. Todos esses homens agem contra os decretos de César, dizendo que há outro rei, Jesus."

Efésios 1:18-23: Essa grandeza é demonstrada na atuação da sua poderosa força, que ele usou com relação a Cristo quando o levantou dentre os mortos e o fez sentar-se à sua direita nos lugares celestiais, muito acima de todo governo, autoridade, poder, domínio e todo nome que possa ser dado, não só neste sistema de coisas, mas também no que virá. Sujeitou-lhe também todas as coisas debaixo dos pés e o fez cabeça sobre todas as coisas no que se refere à congregação, que é o seu corpo, a plenitude daquele que em tudo completa todas as coisas.

Colossenses 1:12-14: ... [O Pai] nos livrou da autoridade da escuridão e nos transferiu para o reino do seu Filho amado, por meio de quem temos o nosso livramento por resgate, o perdão dos nossos pecados.

1 Pedro 3:21, 22: O batismo, que corresponde a isso, também salva vocês agora (não pela remoção da sujeira da carne, mas pela solicitação de uma boa consciência a Deus), por meio da ressurreição de Jesus Cristo. Ele está à direita de Deus, pois foi para o céu; e anjos, autoridades e poderes foram sujeitos a ele.

Vistas no seu contexto, estas passagens indicam claramente que os primeiros cristãos acreditavam que Jesus estava governando, não esperando. Toda a base da sua confiança na salvação e no perdão dos seus pecados baseava-se no entendimento de que tinham um sumo sacerdote governante que poderia interceder ativamente por eles, que o Jesus glorificado estava no céu, sentado à direita de Deus, isto é, governando com o total apoio de Seu Pai, com total autoridade para agir em seu nome.


Estamos Vivendo nos "Últimos Dias"?

Além de acreditarem que Jesus estava reinando, também não há dúvida de que os primeiros cristãos acreditavam que viviam nos "últimos dias". Pedro, por ocasião dos acontecimentos notáveis do primeiro Pentecostes após a ressurreição de Jesus, citou a profecia de Joel como prova desse fato:

«isto é o que foi dito por meio do profeta Joel: '"Nos últimos dias", diz Deus, "derramarei do meu espírito sobre todo tipo de pessoas [...]"'» -- Atos 2:16, 17.

A expressão "últimos dias" aqui traduz o termo grego eschatais hemerais, expressão usada na tradução grega das Escrituras Hebraicas e amplamente entendida pelos judeus como referindo-se à era messiânica. (Isaías 2:2; Oséias 3:5; Miquéias 4:1) A introdução da carta inspirada aos Hebreus reflete esta perspectiva:

"Há muito tempo, Deus falou aos nossos antepassados por meio dos profetas, em muitas ocasiões e de muitos modos. Agora, no fim destes dias, ele nos falou por meio de um Filho". (Hebreus 1:1-2)

A expressão "no fim destes dias" na Tradução do Novo Mundo traduz aqui as mesmas palavras gregas usadas por Pedro no Pentecostes (eschatais hemerais), mas a expressão é traduzida de forma diferente aqui, de modo que suas implicações não são imediatamente evidentes para ninguém, exceto para os estudantes mais diligentes.

Os primeiros cristãos não entendiam a expressão "últimos dias" no mesmo sentido que diríamos num belo dia de setembro, quando sentimos as primeiras brisas frescas do outono: "Estes são os últimos dias do verão." Os judeus geralmente acreditavam que a história humana foi dividida em duas grandes épocas: os "dias anteriores" ou período antes do aparecimento do Messias e os "últimos dias" ou período após o Seu aparecimento. Visto que os primeiros discípulos de Jesus, todos judeus, o aceitaram como seu Messias, eles acreditavam que o seu aparecimento marcava o início dos "últimos dias", ou era messiânica, em contraste com os "dias anteriores" antes de ele aparecer, e apoiavam essa visão por referências às Escrituras Hebraicas.

Os primeiros cristãos judeus tiveram que mudar a sua perspectiva inicial sobre a natureza do seu Messias e do seu governo. Eles esperavam um salvador político que os libertasse da sujeição a Roma. Em vez disso, Jesus os libertou do pecado, da morte e do diabo. Seu reino era bastante real, mas não fazia parte deste mundo. Eles se tornaram parte disso ao aceitá-lo e obedecê-lo como governante. (Colossenses 1:13) Jesus também lhes revelou que partiria e voltaria num momento inesperado. Muitos dos primeiros discípulos evidentemente pensaram que a segunda vinda ocorreria durante a sua vida. Mas à medida que mais e mais daqueles que conheceram Jesus pessoalmente, incluindo os apóstolos, começaram a morrer (muitos como mártires), e a perseguição contra eles se intensificou, eles começaram a compreender que a era messiânica não seria um tempo de abundância física e bênção material (como ensinaram muitos mestres judeus), mas seria, em vez disso, um período prolongado de tribulação, especialmente para os cristãos. Assim, era apropriado que Paulo alertasse Timóteo: "Mas saiba que nos últimos dias haverá tempos críticos, difíceis de suportar." (2 Timóteo 3:1) Depois de descrever o tipo de pessoas que tipificariam esses dias difíceis, ele disse a Timóteo para "se afastar" ("afaste-se", Kingdom Interlinear) dessas pessoas. É evidente que ele não estava alertando Timóteo sobre acontecimentos que ocorreriam muitos séculos no futuro. Na opinião de Paulo, ele e Timóteo viviam nos últimos dias, ou seja, na era messiânica ou cristã.


E Quanto aos "Sinais" Que Jesus Predisse?

As Testemunhas de Jeová acreditam que a profecia de Jesus em Mateus 24 (e passagens paralelas em Marcos 13 e Lucas 21, às vezes chamada de "Discurso do Monte das Oliveiras" ou "Sermão Escatológico", da palavra grega para "coisas finais") descreve uma série de eventos que aconteceria no momento da parusia de Jesus e serviria como sinal de que ela havia começado. O propósito deste documento não é apresentar uma consideração detalhada dessas passagens versículo por versículo, mas apenas fazer alguns comentários relevantes.

Primeiro, uma breve explicação do entendimento da Torre de Vigia da palavra grega parousia em Mateus 24:3. O termo geralmente é traduzido como "vinda" ou "chegada", mas é traduzido como "presença" na Tradução do Novo Mundo. No final do século 19, alguns segundos adventistas decepcionados, discípulos de William Miller, que esperavam que Jesus voltasse em 1843, notaram que parousia foi traduzida como "presença" na Emphatic Diaglott, uma tradução interlinear grego/inglês preparada por Benjamin Wilson. Aparentemente impressionados o suficiente com a cronologia de Miller para não quererem desistir dessa data, alguns deles tiveram a ideia de que talvez Jesus realmente tenha retornado em 1843, exatamente como Miller havia predito, mas que o havia feito de forma invisível.

Russell incorporou as ideias deles em sua própria versão do "tempo do fim". Ele via a parusia de Jesus como um período especial de presença invisível de 40 anos, durante o qual os seguidores de Russell (então chamados Estudantes Internacionais da Bíblia; agora conhecidos como Testemunhas de Jeová) teriam um relacionamento especial com ele, após o qual seriam arrebatados em glória ao céu. Russell viu os eventos descritos em Mateus 24:3-14 como prova de que Jesus já havia retornado, de forma invisível.

Se a parousia de Jesus fosse invisível, talvez fosse necessário algum sinal para mostrar que ela havia começado. Nesse caso, seria estranho que Jesus escolhesse coisas que estariam em evidência quase constante durante toda a era cristã como sinais de algum período especial no seu final. A dificuldade que surge quando olhamos para este tipo de coisas como sinais é demonstrada pelo fato de que Russell apontou os eventos Mateus 24:6-14 (guerra, pestilência, fome, terremotos e outros) como prova de que a parousia de Jesus começou em 1874, e terminaria em 1914. No entanto, hoje as Testemunhas apontam para os mesmos acontecimentos para provar que a parousia começou em 1914, quando Jesus os encarregou de todos os interesses do seu reino na terra.

A palavra grega parousia, no seu significado mais comum, significa presença corporal, mas também pode referir-se à visita de uma pessoa real, o que é consistente com a descrição do próprio Jesus da sua segunda vinda:

"Quando o Filho do Homem vier na sua glória, e com ele todos os anjos, então se sentará no seu trono glorioso. Todas as nações serão reunidas diante dele, e ele separará as pessoas umas das outras, assim como o pastor separa as ovelhas dos cabritos." (Mateus 25:31, 32)

"porque o próprio Senhor descerá do céu com uma chamada de comando, com voz de arcanjo e com a trombeta de Deus, e os mortos em união com Cristo se levantarão primeiro." (1 Tessalonicenses 4:16)

Nos dias de Jesus, muitos judeus acreditavam que imediatamente antes da vinda do Messias haveria uma série de calamidades. Esses "ais do Messias" incluíam guerras, insurreições, pestes, fome, terremotos e sinais ou presságios do céu. Não é improvável que os discípulos de Jesus tivessem ouvido falar destas predições. Visto que estes eventos claramente não ocorreram antes do nascimento ou do batismo de Jesus, quando o ouviram predizer a destruição do templo, eles podem ter perguntado: "É isso que nos disseram para esperar? As desgraças do Messias? A destruição do templo faz parte daquele grande momento de calamidade que esperamos que preceda a sua vinda em glória?"4

Se essa fosse a intenção da pergunta, a resposta de Jesus foi que desastres certamente viriam, mas não seriam um sinal de seu retorno. Pelo contrário, Jesus começou a sua profecia avisando-os para não serem desencaminhados. Ele acrescentou que quando acontecem guerras e rumores de guerras, "Cuidado para não ficar apavorados, pois essas coisas têm de acontecer, mas ainda não é o fim." (Mateus 24:6) Outras catástrofes também surgiriam. Mesmo estas seriam apenas "o começo das dores de parto". Em vez de confirmar que estas coisas seriam o precursor imediato do seu regresso e do seu livramento, Jesus advertiu-os de que esperassem um aumento da perseguição e do ódio por parte de pessoas de todas as nações, e um grande aumento da iniqüidade. Ele disse que eles precisariam de resistência. Suas palavras não apontavam para a libertação iminente, mas para um longo período de tribulação. Os eventos que Jesus mencionou em Mateus 24:3-14 ocorreram frequentemente ao longo dos séculos, desde os dias dos apóstolos. Periodicamente, durante esses séculos, uma pequena minoria de cristãos tentou provar que a volta de Jesus era iminente, apontando a prevalência de guerras, terremotos, fome, pestes e coisas do gênero. Eles ficaram desapontados todas as vezes.5 Na verdade, as palavras de Jesus têm se cumprido já há quase dois mil anos, e o fim ainda está no futuro.

As palavras de Jesus podem ter sido o primeiro indício dos discípulos de que a era messiânica não seria o tempo de grande paz política e prosperidade material que alguns mestres judeus podem ter sido levados a esperar. Possivelmente associaram a destruição de que ele falou com o seu regresso, e por isso fizeram apenas uma pergunta, mas a resposta de Jesus abrangeu dois eventos separados: primeiro, a destruição do templo judaico e, segundo, o regresso ou parusia de Jesus, ambos os quais eles podem ter pensado que ocorreria ao mesmo tempo.

Jesus deu-lhes instruções específicas sobre o que fazer no momento da destruição de Jerusalém. Mas, ao mesmo tempo, ele os advertiu de que os eventos que eles poderiam ter considerado sinais de sua parusia não eram sinais verdadeiros, mas sinais falsos, esperados por alguns judeus em conexão com a chegada gloriosa do Messias, mas não relevantes para a segunda vinda de Jesus. É muito significativo que, em vez de lhes dar um sinal que apareceria num período de tempo significativo, até mesmo anos, antes da sua segunda vinda, ele os exortou repetidamente a manterem-se alertas, vigilantes. Ele comparou seu retorno à visita de um ladrão durante a noite. Os ladrões não fornecem nenhum aviso prévio antes de atacar. -- Mateus 24:43, 44


Conclusão

Para resumir, existem problemas insuperáveis com a visão da Torre de Vigia. Primeiro, a ideia de que se pode prever por qualquer meio quando Cristo retornaria está em contradição direta com a advertência claramente declarada de Jesus de que ele retornaria num momento que seus discípulos não pensavam que seria. A ideia de qualquer tipo de sinal que avisasse antecipadamente o regresso de Jesus contradiz completamente o que ele disse claramente em numerosas ocasiões, que a sua parusia seria ao mesmo tempo súbita e inesperada: "Sejam vigilantes, mantenham-se despertos, pois vocês não sabem quando é o tempo determinado." (Marcos 13:33) Se acreditarmos na sua palavra, o discurso de Jesus no Monte das Oliveiras não fornece uma maneira de prever uma presença invisível ou a sua segunda vinda iminente.

Em segundo lugar, o conceito da parusia de Jesus como um evento invisível não pode ser conciliado com as Suas palavras: "estou com vocês todos os dias, até o final do sistema de coisas" (Mateus 28:20), o que mostra claramente que Jesus estaria sempre invisivelmente presente com os seus discípulos. Também contradiz diretamente Apocalipse 1:7, que diz "Vejam! Ele vem com as nuvens, e todo olho o verá, incluindo aqueles que o traspassaram; e todas as tribos da terra baterão no peito de pesar por causa dele." Isto ensina claramente que a parusia de Jesus seria tudo menos invisível.

Terceiro, se permanecermos fiéis ao sentido original e mais direto das Escrituras, devemos concluir que Jesus começou a governar no primeiro século, e que todos os cristãos que viveram desde o primeiro século até agora viveram nos últimos dias, ou seja, a era messiânica. Tanto a evidência bíblica como a histórica mostram que Jesus Cristo começou a reinar no primeiro século e que o seu reinado continuou "no meio dos seus inimigos". Sendo assim, temos também de concluir que a situação que tem existido entre as pessoas que afirmam ser cristãs é a que Jesus esperava, e que o modo como as coisas se desenvolveram está em harmonia com a sua vontade soberana como rei sobre o céu e a terra. Qualquer grupo que tenha começado durante qualquer um dos séculos seguintes à era apostólica não pode reivindicar seriamente ser a verdadeira igreja de Jesus.

Não temos motivos para concluir que Jesus abandonou os seus seguidores ao seu inimigo, o diabo, no final do período apostólico, como Russell acreditava e ensinava. Também não há base para concluir que perto do final do primeiro século, as coisas de alguma forma saíram do controle de Jesus e todo o corpo de Cristo tornou-se tão corrupto que perdeu a sua posição como a verdadeira Igreja que ele fundou. Se Jesus tem "toda a autoridade no céu e na terra" e enviou os seus discípulos para pregar e ensinar com base nisso, devemos concluir que tem havido verdadeiros seguidores de Cristo ao longo dos séculos, desde que Jesus andou na terra. Se procurarmos e examinarmos honestamente as evidências históricas disponíveis, poderemos ver que a Igreja fundada por Jesus no primeiro século permaneceu em existência continuamente desde então.


Nota do Editor

[Tom Cabeen contribuiu com o artigo acima e também forneceu as seguintes informações básicas que incluem algumas de suas próprias experiências relevantes para o tópico acima. Abaixo cito as informações adicionais que Tom forneceu com o artigo.]

Há muitos anos, no final da década de 1970, Carl Olof Jonsson, um ancião Testemunha de Jeová da Suécia, escreveu uma carta à Sociedade Torre de Vigia na qual relatou os resultados de algumas pesquisas que fez em resposta a um desafio que lhe foi feito por um homem que contactou no trabalho de porta em porta. O assunto era cronologia. Meu amigo Raymond Franz, que escreveu o artigo sobre cronologia no livro da Torre de Vigia Aid to Bible Understanding (Ajuda ao Entendimento da Bíblia), me deu uma cópia da carta, que ainda tenho hoje. Ray fazia parte do Corpo Governante das Testemunhas de Jeová na época e sabia que eu estava lutando com algumas das doutrinas da Torre de Vigia. Li a carta repetidas vezes. Não consegui encontrar nenhuma falha nem nos argumentos nem nas conclusões. Acabei com sérias dúvidas sobre a cronologia da Torre de Vigia, que entendi ser fundamental para grande parte da teologia da Torre de Vigia e fortemente influente na sua interpretação de outros assuntos doutrinários.

Essa carta, mais do que qualquer outro fator, fez com que eu renunciasse ao meu cargo na sede da Torre de Vigia em Brooklyn. Se a Sociedade Torre de Vigia estava errada sobre o fim estar muito próximo, então minha esposa e eu precisávamos começar a nossa família. Nós dois tínhamos trinta e poucos anos na época e o tempo estava se esgotando para nós. Tínhamos adiado ter filhos devido à nossa crença (a minha mais que a dela) de que "o fim" estava muito próximo. Essa crença baseou-se fortemente na minha aceitação da cronologia da Torre de Vigia.

Acima está um artigo que escrevi há vários anos. Escrevi-o em parte para ajudar as Testemunhas de Jeová a verem os problemas com a cronologia da Torre de Vigia e as conclusões a que ela leva, mas também estava a explorar a abordagem adotada pelas Testemunhas de Jeová e outras pequenas seitas no que diz respeito à interpretação das Escrituras. Modifiquei minhas opiniões sobre algumas das questões contidas no artigo, mas ele ilustra não apenas os problemas com a abordagem da Torre de Vigia, mas aqueles enfrentados por qualquer pessoa ou grupo que afirme basear crenças teológicas no princípio protestante da sola scriptura (somente as Escrituras).

Certa vez pensei que apenas o conhecimento correto, ou pelo menos encontrar a abordagem correta, poderia produzir interpretações precisas das Escrituras. Finalmente concluí que simplesmente não há informação suficiente apenas nas Escrituras para que alguém, por si só, encontre a verdade do Cristianismo em sua plenitude. Existem muitas maneiras de entender as palavras (literalmente, simbolicamente, figurativamente, alegoricamente, etc.), e é por isso que todos que tentam interpretar as Escrituras acabam sendo influenciados por outros. No final das contas, todos acabam escolhendo apenas a explicação que mais gostam. A verdade cristã, usando esta abordagem, finalmente se resume ao julgamento pessoal. Penso que é bastante fácil ver como isto funcionou no caso de Russell e dos seus sucessores na Sociedade Torre de Vigia.

Se o Cristianismo for verdadeiro, e se Cristo ressuscitou e está ativamente em relacionamento com seus discípulos, pensei, deve haver alguma maneira de encontrar a verdade que seja independente dos recursos pessoais de cada um. No final das contas, acabei adotando a abordagem histórica. Se Jesus fosse quem afirmava ser, deveria haver uma Igreja em existência contínua desde os dias dos apóstolos até hoje. Comecei a ler vários escritos não-canônicos dos primeiros cristãos, começando com aqueles que conheciam pessoalmente os apóstolos ou eram contemporâneos deles. Fiquei impressionado com a coerência e a notável semelhança de doutrina entre escritores que estavam separados pelo tempo e pela grande distância geográfica, durante um período em que não havia nem a tecnologia nem a capacidade para algo parecido com a publicação centralizada de ensinamentos ou instruções como as dadas por líderes da Torre de Vigia para Testemunhas de Jeová. É evidente (pelo menos para mim) que estes primeiros escritores cristãos (a maioria deles bispos ou superintendentes) foram ensinados por pessoas que estavam empenhadas em preservar o que lhes tinha sido transmitido, em vez de desenvolver novas interpretações.

Alguns sabem que acabei aceitando a fé católica. Estou convencido de que é a mesma fé ensinada pelos apóstolos, embora desenvolvida e ampliada desde então, é claro. No início deste ano, fui ordenado Diácono naquela Igreja. Toda a minha família se converteu e estamos muito felizes por sermos católicos. Todos nós acreditamos na veracidade e autenticidade da fé católica.


Notas

1 A palavra aramaica que Daniel usou aqui para "tempo" significa apenas um período inespecífico, nem sempre um ano. (A palavra para ano, como em Daniel 1:1, é diferente.) A palavra usada aqui é 'idd'n, que, de acordo com o Theological Wordbook of the Old Testament (Livro de Palavras Teológicas do Antigo Testamento), significa "tempo, período, intervalo, ano, era". Dois significados básicos são igualmente um "ponto no tempo" ou um "período de tempo". Neste contexto, um "tempo" poderia facilmente significar uma semana, um mês ou uma estação, não necessariamente um ano.

2 Um leitor salientou que Revelação 11:2-3 relaciona "tempos" com dias de uma maneira diferente: "Mas, quanto ao pátio fora do santuário do templo, deixe-o de fora, sem medi-lo, porque foi dado às nações, e elas pisarão a cidade santa por 42 meses. Farei as minhas duas testemunhas profetizar por 1.260 dias vestidas com pano de saco." (TNM) Aqui o texto é bastante semelhante ao de Lucas 21:24: ("Jerusalém será pisada pelas nações"). A palavra grega para "pisar" é a mesma em ambas as passagens, e ambas falam de Jerusalém, a "cidade santa". Este texto descreve um período de "pisoteio" ​​que durou quarenta e dois meses ou 1.260 dias, em vez de 2.520!

3 Veja The Gentile Times Reconsidered (Os Tempos dos Gentios Reconsiderados), 3.ª Edição, Carl Olof Jonsson, Commentary Press, 1998, pp. 264-270.

4 Para detalhes, ver artigos de M. Brunec, SBD, CDB, publicados pelo Pontifício Instituto Bíblico nos sucessivos fascículos dos Volumes 30 e 31 da Verbum Domini. Este artigo também me foi dado por Ray Franz.

5 Uma excelente consideração de todo esse assunto é encontrada em Doomsday Delusions (Enganos do Dia do Juízo Final), 1995, por C. Marvin Pate e Calvin B. Haines, Jr., InterVarsity Press.


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